E a platéia não sabe o que é felicidade

Era uma vez um circo com muitos palhaços, contorcionistas, homens-bala, equilibristas, domadores e uma platéia. E a platéia é feliz. Olhando por fora, esse circo é um lugar lindo, onde todos os artistas vivem em harmonia e se dão bem apesar das dificuldades. Quando eu fui me aproximando, percebi que nada era tão belo quanto parecia. Os palhaços em seus palanques fazendo suas ‘graças’ e roubando a platéia, e a platéia aplaudindo feliz. Os homens balas lutando contra pobres contorcionistas que tentam se manter fortes e se desviarem de balas perdidas. E a platéia é feliz. Os equilibristas se equilibrando entre um mês e outro, entre um salário e outro, entre um filho e outro. Entre contas a pagar e dívidas a fazer. Alguns dos equilibristas pertencem à platéia. E a platéia é feliz. Nesse circo, os animais são extremamente maltratados junto à platéia. E é aí que os domadores agem. Eles são subordinados dos grandes gigantes, servem para conter a fúria da platéia, com violência se preciso for. Os domadores agem também nos matadouros, onde o sofrimento domina. E a platéia é feliz. As pessoas desse circo se julgam melhores do que outros animais. Julgam-se no direito de prender, matar e maltratar outras espécies. Rola um enorme preconceito. E a platéia é feliz. Quando a platéia acha que está infeliz, paga por outro espetáculo. Pagam para sofrerem violências e ver seus semelhantes matando e sendo mortos por domadores nas portas dos estádios. Pagam por sofrimento, por dor. E a platéia é feliz. Nossos artistas preferem passar dias acampados na porta de um estádio do que passar algumas horas em uma recepção para cobrar seus direitos. E a platéia acha que é feliz. Bem vindo ao nosso circo, o nome dele é Brasil, mas pode chamá-lo de PAÍS DO FUTEBOL. Acomode-se que o show está apenas começando.